RAPOULA DO COA


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caique no Côa: Rapoula / Badamalos
Requiem pelo Côa: 6/9/2000 (Nova Guarda) Carta aberta a: Sr. Presidente da Câmara Municipal do Sabugal Associação de Pesca Desportiva de Quadrazais Serviços Florestais da Guarda Reserva Natural da Serra de Malcata Todos os pe(s)cadores que o frequentam Acabo de visitar o website oficial da Câmara Municipal do Sabugal e li as seguintes palavras: "The presence of the River Côa is not a source of beauty alone. It is the ideal place for the practice of sporting and recreational activities, of which trout-fishing comes particularly recommended." Perdoem-me a falta de tradução, mas o referido site também não apresenta o equivalente na língua materna. Exmos Srs., lamento informar que essa não é a realidade de facto sobre o Rio Côa. Desde que me dedico à pesca desportiva de trutas (e já lá vão 24 anos...) que calcorreio as margens do Rio Côa entre as Freguesias de Vale de Espinho e Malcata (noutros tempos até à Rapoula do Côa). É pena que agora não o possa fazer, pois apenas resta uma terça parte desse maravilhoso troço de rio, (que na altura se prolongava até à Rapoula do Côa e que talvez perfizesse cerca de 40Km de rio) local paradisíaco para a pesca das nossas amigas pintonas. Que não doa a consciência a ninguém pelo facto de a barragem do Sabugal e a poluição impune terem decretado a morte do Alto Côa. Fomos todos nós, uns por indiferença, outros pela ganância outros ainda por incúria, que contribuímos para o actual estado de desgraça em que caiu este tesouro ecológico e turístico que a todos pertencia. Ou será que ninguém sabia que este troço de rio era sinónimo de um ecossistema - dos mais delicados que possa haver - único em todo o Concelho do Sabugal e só igualado por meia dúzia de cursos de água em todo o País ou mesmo até em toda a Península? Ainda há dias, na Freguesia de Quadrazais, em conversa com um emigrante que me confessava ter pescado por quase toda a Europa, afirmava ele que este nosso Côa era o melhor rio truteiro de entre todos aqueles que conhecia. Pois é, mas agora já não há Côa. Ou melhor, resta pouco mais de uma dúzia de quilómetros, uma boa parte deles sob a gestão da Associação de Pesca Desportiva de Quadrazais, a qual não parece estar a fazer uma gestão adequada à presente realidade. O que resta do Rio Côa ainda poderá vir a ser a "catedral" da pesca à truta no nosso País. Eis as medidas a tomar: 1- Eliminar radicalmente as fontes de poluição do rio - melhorar o funcionamento de ETARes, efluentes industriais e esgotos (note-se que existem apenas 3 povoações capazes de poluição a nível de rede de esgotos!) 2- Conseguir junto da administração central a gestão da totalidade do rio que sobreviveu à barragem (esta foi outra das calamidades ambientais). 3- Decretar o encerramento da pesca desportiva na totalidade do rio até que a população autóctone se restabeleça e atinja um número considerável de exemplares capazes de fazer face à consequente pressão de pesca. 4- Estabelecer troços de rio em que apenas se possa praticar a modalidade de pesca com mosca artificial e sem morte. 5- Nos restantes troços permitir apenas a captura de um exemplar troféu a cada pescador e em cada dia. 6- Cobrar uma taxa de licença diária a cada pescador no valor de 400$00 para residentes no concelho e 1.000$00 para os restantes. Por outro lado, e eu sei que isto fala ao ouvido de muito administrador, falemos em números... Depois de implementadas com sucesso as medidas referidas, não será muito difícil conseguir uma afluência diária de 45 pescadores (30 residentes + 15 Nacionais e praticando as taxas acima referidas isso resulta numa facturação de cerca de 4.100 contos por temporada. Se deduzirmos os custos inerentes aos vencimentos anuais de 2 Guardas, manutenção de veículos e custos de repovoamento piscícola e manutenção do rio, é fácil perceber que afinal, o Sabugal sempre teve um tesouro turístico escondido debaixo do nariz. Pensem nisso... Vão ver que os comerciantes, a população que desfruta do rio e também os peixes vão agradecer... Ah! Quase me esquecia...! Deixo aqui o relato de uma jornada de pesca de um possível pescador(a), neste caso uma companheira espanhola, num não menos possível Rio Côa (a tradução é minha): "Eu não pesco. Mas que maneira de começar uma fantástica história de pesca! Eu não pesco mas o meu marido sim. Tudo começa numa segunda-feira à noite. Aurelio pergunta: Azu, vamos pescar amanhã? Está bem, respondo eu iludida. Sempre compreendi o vício, mais que o gosto, do meu marido em relação à pesca com mosca, mas apesar disso hoje foi a prova de fogo. Já vos conto. Saímos o mais cedo que se pode sair quando temos dois filhos pequenotes; primeiro há que deixá-los com a avó. Chegámos ao rio ao meio-dia; almoçámos com apetite e preparámo-nos para começar o que, sem o saber, iria ser um excitante e formoso dia no rio. Uma hora mais tarde já estávamos na água e começámos a vadear. Como tantas outras vezes o ambiente que me rodeia enche-me de uma paz que nunca encontrei em nenhum outro lugar. As trutas estão um poucochinho difíceis e comentamos o facto entre risos e esperanças. Eu, enquanto Aurélio lança uma vez e outra, experimenta esta mosca e aquela, fala sozinho, olha para o céu, comenta - se chovesse um pouco! - sinto estar no paraíso. E eu digo-lhe, não te queixes, se ainda vês algumas e já conseguiste prender algumas. E ele sempre a dizer, sim, mas pequenas. E assim foram cinco, as horas que passámos no rio como se fossem apenas cinco segundos. De volta ao carro, e ele leva no cesto quatro trutas que, no meu fraco entender, não são nada más. Passo as horas observando-o, maravilhada com tão bonitos lançamentos. E cada vez que alguma sobe à superfície para comer, grito emocionada: olha uma, estás a vê-la, apanha-a! Decidimos ficar para o entardecer. É a minha primeira vez. Em todos os outros crepúsculos eu esperava em casa até que ele chegasse, umas vezes acordada, muitas outras preocupada no sofá. Foi tão...Não sei como contar, senti-me como se tivesse outra vez dez anos e tivesse passado os momentos mais divertidos do mundo. Ver, viver e gozar o modo como o meu marido, depois de se lhe terem escapado duas trutas de tamanho considerável, lutava com uma que era enorme, que não deixava de batalhar tentando escapar, dobrando a cana de tal modo que eu não podia pensar em mais nada se não deitar-me à água na tentativa de a apanhar, sem parar de comentar; que grande, que bonita, é enorme! Não posso crer! Queres a rede? Aurélio, que faço, queres ajuda? E ele, tranquilo, com uma cara tão especial como só a tinha visto duas vezes antes - nos dias em que nasceram os nossos filhos - não parava de me dizer sem se alterar: deixa-a, que lute, o mais bonito na pesca é isto, a luta, olha como resiste e tenta escapar, deixa que lute e possamos medir forças. E eu, com tudo isto, histérica, desejando que por fim entrasse para a rede não só a truta mas sim o rio inteiro. Enfim, senti até vontade de chorar... Agora é uma hora da madrugada, Cheguei a casa, beijei os nossos filhos e, enquanto dormiam, contei-lhes que finalmente tinha compreendido muitas coisas. Eu não pesco. Mas o prazer que me proporciona tudo aquilo que posso ouvir, cheirar e ver no rio, nas árvores...., desejo com toda a minha alma que os meus filhos, um dia, também aprendam a senti-lo. Foi maravilhoso. Aurélio fala sempre com paixão depois de um arrasador dia de pesca, e hoje compreendi tudo isso enquanto durava aquela luta. Um minuto que valerá uma eternidade. Azucena Díez Gascón" Palavras para quê? José Manuel Maia Lopes


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